Saiu da sala de cabeça baixa, passando pelos alunos alvoroçados. Caminhou firmemente contando os paralelepípedos da rua da escola, sem nunca olhar pra trás. Sabia que era seu último dia, e mesmo assim não conseguiu pensar em ninguém pra se despedir. Logo estaria fora da escola, da cidade e de tudo que conhecia.

O silêncio da garota demonstrava a falta de vínculo, mas isso não a deixava feliz em partir. Ela não tinha nada que a prendesse, porém também não tinha nada de bom a esperar.

Voltou pra casa com os olhos secos, vazia. Entrou em casa e sua mãe não a esperava com o almoço feito. Devia estar deitada de novo. A garota se aproximou da porta fechada do quarto da mãe. Não bateu, abriu devagar. Dormia. Não, na verdade a mãe olhava para o teto, fixamente. Mãe, chamou a garota. Pigarreou quando a voz saiu falha, falta de uso. Mãe? Sem resposta. A garota viu o vidro de remédio no criado mudo. Fechou a porta e foi para a cozinha preparar o almoço.

Seu pai não chegou do trabalho no fim da tarde porque não tinha pai. Não sabia dele há anos. Terminou as últimas lições de casa e fechou o caderno, pousando o lápis carcomido sobre a capa. A mãe não se levantou enquanto a garota fez as malas e tomou banho.

As dez para sete ela estava pronta. A vó veio buscá-la e levou-a para a casa dela, numa cidade vizinha. Fez um chocolate quente na hora de dormir. Fez também a promessa que dentro de poucos dias poderiam visitar sua mãe na clínica onde ela seria internada pela manhã. A garota não respondeu. Bebericou o chocolate quente, deitou-se e fechou os olhos.

A vó apagou as luzes.